O MPF (Ministério Público Federal) e o Ministério Público do Pará apuram a morte de uma adolescente indígena de 17 anos que, de acordo com relato da família, foi vítima de violência obstétrica.
A adolescente morreu no último dia 22 de junho após ter um bebê no Hospital Materno Infantil de Marabá, de responsabilidade do município. Conforme relato da mãe da vítima à Promotoria do estado, um médico insistiu no parto normal mesmo depois que a jovem começou a passar mal.
Segundo a família, o médico teria sido avisado por outro profissional de saúde que a paciente poderia morrer caso não fosse feita uma cesariana, mas ele insistiu no parto normal. A família relata que a adolescente sofreu hemorragia e duas paradas cardiorrespiratórias e diz que o bebê teria sido tirado à força.
Regilanne Guajajara, tia da adolescente, conta que a indução ao parto aconteceu após a gravidez completar 40 semanas e não haver sinais de contração.
"Depois que começaram a indução, ela começou a passar muito mal, vomitou bastante, desmaiou e não não foi bem assistida pelos profissionais de saúde da maternidade. No dia seguinte, eles continuaram induzindo o parto, mesmo ela já estando fraca, mesmo ela já não tendo mais condições de ter a criança de parto normal", disse.
A tia, que é técnica de enfermagem, disse ainda que a sobrinha teve convulsões durante o parto, complicação característica de eclâmpsia, que representa risco significativo para a mãe e o bebê.
"Ela teve as duas paradas cardíacas, e mesmo assim eles continuaram fazendo o parto. Ela foi reanimada, o bebê também nasceu e não chorou. Aí depois a gente soube que ele também teve que ser reanimado", afirma, acrescentando que a criança está em casa, sob cuidados da família.
Após o parto, a adolescente foi transferida, já em estado gravíssimo, para o Hospital Regional do Sudeste do Pará Dr. Geraldo Veloso, conforme a Secretaria de Saúde do Estado. Ela chegou intubada, com o histórico de hemorragia e duas paradas cardíacas, e foi internada na UTI, mas morreu no local, diz nota enviada pela pasta.
No procedimento que instaurou para apurar o caso, o MPF enviou ofício à Secretaria Municipal de Saúde de Marabá para que se manifeste sobre as medidas hoje implementadas para reprimir a violência obstétrica no Hospital Materno Infantil do município, além de solicitar as taxas de morbimortalidade materna, perinatal e neonatal registradas na unidade. A investigação criminal será de responsabilidade do Ministério Público estadual, pela 3ª Promotoria de Justiça Criminal de Marabá.
Segundo consta em documento de 2024, o hospital tem histórico de casos do tipo. Em 2022, uma ação ajuizada pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) do Pará contra o município e o Hospital Materno Infantil pediu providências que interrompessem os casos de violência obstétrica no hospital.
Em 2024, o MPF se manifestou no processo, concordando com os pedidos da OAB-PA e pedindo à Justiça para figurar como coautor do processo. No documento, consta que 48 casos de violência obstétrica foram denunciados ao Ministério Público estadual entre 2016 e 2021.
"Estas cifras, de certo, não são condizentes com a realidade enfrentada. O problema, infelizmente, é bem maior", diz o texto assinado pelo procurador Igor Lima Goettenauer de Oliveira. No mesmo ano, a Justiça Federal remeteu o caso para a Justiça Estadual.
A violência obstétrica é considerada um tipo de violência de gênero e refere-se a práticas inadequadas, negligentes ou abusivas contra mulheres no período de gravidez, parto e pós-parto.
A Corte Interamericana de Direitos Humanos determinou, em 2023, que os Estados têm o dever de fornecer serviços de saúde apropriados, especializados e personalizados durante a gravidez, o parto e, por um tempo adequado, após o parto.
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