O governo Donald Trump acabou com o órgão responsável oficialmente por negociações climáticas e, com isso, ampliou as dúvidas sobre a participação dos Estados Unidos na COP30, conferência do clima marcada para novembro, em Belém.
O Escritório de Mudanças Globais foi eliminado do Departamento do Estado, pasta com atribuições semelhantes ao Ministério de Relações Exteriores, como parte de uma reestruturação do órgão.
Um porta-voz do Departamento de Estado afirmou à Folha de S.Paulo que qualquer trabalho relevante conduzido pelo escritório terá suas atribuições transferidas para outra área.
O órgão não confirmou se o fim desse gabinete enterra as chances de participação na COP30. Associações de meio ambiente e negociadores climáticos, porém, acreditam que a decisão é mais um sinal dos EUA que, somado à postura de negar as mudanças climáticas, tornam distante a participação na conferência climática das Nações Unidas.
Cresce ainda o receio de que, se o país decidir enviar uma delegação a Belém, será para dificultar avanços nas negociações climáticas, porque se posicionaria - e teria a capacidade de liderar outras nações- em interesses distintos aos do Brasil.
O Escritório de Mudança Global tinha entre suas atribuições fazer negociações com as Nações Unidas, entre elas, as ligadas ao clima. Sua equipe tinha negociadores experientes, de carreira, que ora foram demitidos ora remanejados no processo de reestruturação do Departamento de Estado.
É mais uma medida do governo indicando que o tema não é prioridade. Assim que tomou posse, Trump assinou um decreto determinando a saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris. A ordem executiva diz que a retirada deveria ser imediata.
Pelas regras da ONU, porém, a baixa efetiva de um país só se dá um ano após a decisão. Por isso, formalmente, os EUA ainda fazem parte do Acordo de Paris e têm um assento garantido na COP, caso decidam participar.
Segundo a CNN, a ausência do escritório chancelaria a não participação dos EUA nas reuniões de novembro. Pessoas familiarizadas com o assunto, contudo, destacam a imprevisibilidade de Trump como um fator a ser considerado. O presidente Lula (PT) reafirmou nesta semana que gostaria de ligar ao presidente americano para convidá-lo à cúpula.
Um integrante da equipe de organização da COP no Brasil afirmou que o país não recebeu nenhum sinal por enquanto de que os Estados Unidos vão comparecer ao evento. O fato de o país não ter participado da conferência climática de Bonn, espécie de pré-COP ocorrida em junho, na Alemanha, é mais um indício.
riram Madhusoodanan, diretor e um dos porta-vozes da Rede de Ação Climática dos EUA, ressalta que o fim do escritório significa perda de relações diplomáticas e três décadas de histórico de negociações climáticas. No entanto, avalia que isso não é suficiente para assegurar que os EUA não participarão da COP.
"O Escritório de Mudança Global tinha certamente os principais negociadores que estiveram envolvidos na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima e no Acordo de Paris por muitos anos. É definitivamente uma perda de conhecimento institucional", avalia.
Madhusoodanan lembra que os Estados Unidos ainda têm participação em outros processos da ONU e que tentarão impor sua agenda. Por isso, para ele, que faz parte da maior rede da sociedade civil de organizações climáticas dos EUA, poderia ser melhor inclusive que a equipe de Trump se ausentasse da COP30.
"Acho justo dizer que eles apareceriam [em Belém] para causar caos, e haveria um poderoso movimento global para resistir ao que eles estariam fazendo lá. Porque não nada de bom pode vir do envolvimento deles, dada a agenda mais ampla que eles estão promovendo ao redor do mundo", avalia.
Claudio Angelo, coordenador de política internacional do Observatório do Clima, rede com mais de cem organizações ambientalistas no Brasil, ressalta que os EUA não foram a nenhum evento de discussão multilateral sobre o clima neste ano e, se seguirem essa lógica, não irão a Belém.
"O problema é que este governo joga exatamente na imprevisibilidade. Então, mesmo fechando o escritório, mesmo não tendo mais uma equipe dedicada a isso dentro do Departamento de Estado, não dá para descartar ou duvidar que os Estados Unidos mandem um representante à COP30 só para atrapalhar a conferência", diz.
"Por mais que a ausência dos Estados Unidos do esforço multilateral seja uma catástrofe, pelo fato de eles serem o segundo maior emissor de gás de efeito estufa do planeta", pondera.
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